CARA-POETA

sou “cara-poeta” por natureza

por ser “poeta”
percebo estranhamente o mundo
os dias passam sem calendários
meu tempo não tem relógios
sigo tempos distintos
tempo dos meus instintos

por ser “cara”
não percebo o mundo
corro contra as horas e os dias
sou fantoche das rotinas
e deixo o construto social
contar minha história
inventar minha memória

DEVORO sonhos
dormidos e mofados
vazios e enfadonhos
nos momentos errantes
naqueles dias tristonhos

devoro sim
pedaços esquecidos
versos inacabados

misturo animal
misturo poeta
misturo um pouco de mim
ao que me resta
e me devoro

A BOCA

Porque tua boca
é tão pouca
para todos os beijos
que meus desejos
querem suplicar?

Porque os teus lábios
não se descobrem sábios
para minhas fantasias
e minha anatomia
loucamente te habitar?

POETA DO AVESSO

vistam as minhas luas

costumo despí-las

durante a noite

quando escrevo os meus versos

queimem minhas musas

em fogueiras medievais

costumo idolatrá-las

nos momentos de paixão

rasguem os meus livros

costumo lê-los e seguí-los

nos momentos de solidão

mas preservem o poeta

sou um animal sonhador

posso recriar toda a magia

desse mundo poético perturbador

DO DESEJO DO POETA

o meu falo tem palavras

muitas imagens e melodias

e no ápice do meu lirismo

poesia, poesia e poesia

DA FRAGILIDADE DO POETA

sou palavra ambulante

seguindo um destino errante

vivo do meu coração palpitante

e da minha mente inquietante

CICLO DA PALAVRA

no começo, a palavra

se transforma em larva

depois habita casulos

repletos de desejos nulos

mas enquanto todos esperam pela borboleta

nasce do ventre a poesia perfeita

PROIBIDO PARA MENORES

para me tomar
nada de me misturar

tenho sonhos gaseificados
beijos altamente alcoólicos

posso embriagar
com meu olhar devasso
com o calor dos meus braços

sem falar das minhas palavras
geladas, amargas e licoradas
elas rasgam a garganta
daqueles que bebem o poeta

CRIADOR E CRIATURA

Sou poeta e sou poesia.
Que tristeza! Que alegria!
Reescrevo-me todo dia.

BAGAGEM

carrego malas cheias
de florbelas e de adélias
de clarices e de coralinas

carrego malas por onde ando
carrego minha tristeza e alegria
carrego um coração cheio de sonhos
carrego nos braços minha poesia

MAPA

sou um mapa sem rotas definidas
sem estradas ou avenidas
se quiseres me encontrar
não adianta perguntar
não tenho placas, nem direção
vivo das vontades do meu coração